Temos tanto medo de ficar sozinhos que nem percebemos que já estamos sós

Por Raquel Alves

Somos rodeados de medos. Uns tem muitos medos, outros nem tanto. Uns tem medos tão grandes que são os próprios medos que tem as pessoas e não o contrário. Outros, já são mais corajosos e se lançam aos desafios a despeito dos receios. E entre a lista enorme de medos que temos, acredito que ficar sozinho seja um dos campeões.

E o que é ficar sozinho? Ficar solteiro? Ser abandonado pela família e pelos amigos? Ficar velho e isolado?

Interessante que a nossa cabeça não faça a construção lógica das coisas. E a lógica seria: nos esforçarmos para sermos pessoas agradáveis, daquelas que a gente tem vontade de ficar ao lado, e assim o restante se construiria por si só. O risco da solidão seria bem pequeno.

Mas até parece que funcionamos de forma matemática e organizada assim. Nessas horas vejo que o medo de ficar sozinho – assim como todos os demais- é muito mais profundo do que costumamos dar conta. Meu palpite é que nosso medo não é de ficarmos sozinhos em si, mas de termos que lidar com a nossa própria companhia.

Se formos uma ótima companhia, seremos assim tanto para os outros como para conosco mesmos. Eis aí o grande “X” da questão! O que encontramos quando conversamos com a gente mesmo? Gentileza, boas músicas, boa leitura e boas ideias? Amor pela vida, vontade de produzir coisas boas e carinho para com os demais? Ou somos um silêncio ensurdecedor de quem não emana palavras e nem ideias? Somos nós o reflexo daquilo que admiramos e amamos ou somos o reflexo daquilo que de tanto temer acabamos por ser? O fato é que SOMOS. Assim mesmo, em maiúsculo porque somos completos e inteiros em nós.

O Flávio Gikovate, admirável psiquiatra, nos ensinou que não somos meia laranja que vive em busca da nossa outra metade. Somos laranjas inteiras. O que seria de nós se alguém depositasse na gente a responsabilidade pela sua felicidade? Creio que seria peso demais! Sem contar que, aqueles que atribuem aos outros a responsabilidade por sua felicidade em geral sufocam, enjoam e cansam.

O medo de ficar sozinho está intimamente ligado ao que refletimos para nós e para o mundo. Sendo laranjas inteiras, temos mais coisas atrativas! E outros nos rodearão não porque são obrigados a preencher a nossa metade faltante, mas porque simplesmente querem! E contra o “eu quero” não há argumentos!

É preciso cuidar com as analogias… Laranjas pela metade, panelas sem tampa, pinguins sem geladeira, samambaias sem xaxim… Oras que mania de incompletude é essa? Somos corpo e alma. E essa por si só já é tão grande que podemos passar a vida toda preenchendo, alimentando, escarafunchando e mesmo assim não nos descobriremos por completo!

Não são os outros que tem que nos fazer felizes. E nem nós que temos que fazer os outros felizes. Essa necessidade de completar o incompleto faz com que a gente amasse a própria tampa para se encaixar na panela de alguém… É sábio isso? E fica aqui a pergunta: é possível amar outra pessoa sem amor próprio?

É preciso separar amor de dependência. Aqueles que são metade dependem da outra metade. Mas aqueles que amam e são amados sabem bem o gosto bom que o amor tem. Por que para amar o outro é preciso amar a si mesmo em primeiro lugar. E quem ama a si próprio e se reconhece como boa companhia, jamais padece de solidão



Para todos aqueles que desejam pintar, esculpir, desenhar, escrever o seu próprio caminho para a felicidade.