Um vinho, poemas de Caio Fernando Abreu e uma dose de autocontrole, por favor!

Por Pamela Camocardi

Acredite: Caio Fernando Abreu não lhe conhecia, mas descreveu seus sentimentos como se os tivessem criados.

Assumindo ou não, a verdade é que todos, em algum momento na vida, encontram-se nos poemas de Caio Fernando Abreu. Popularizado na internet, assim como Clarice Lispector e Carlos Drummond de Andrade, o escritor ganhou fama após sua morte em 1996 e conseguiu, através das redes sociais, uma legião de fãs que poucos escritores possuem. 13036410.jpegOs poemas do escritor, altamente parafraseados nas redes sociais, tratam de assuntos cotidianos sempre abordados por meio de uma linguagem muito próxima da coloquialidade. Único e extremamente intuitivo, o autor expõe os sentimentos humanos com a naturalidade como quem coloca uma mesa para um café. A alma humana encontra-se, em seus livros, marcada por uma realidade ora chocante, ora romântica e que, por motivos não difíceis de entender, deram ao autor o título de “fotógrafo da fragmentação contemporânea”. Seus textos que falam de sexo, de medo, de morte e de solidão, parecem dilacerar o leitor gradativamente com o passar das páginas.

Vamos às provas. Em “ Pequenas Epifanias”, Caio apresenta o amor de uma forma bem diferente da convencional: “No século XX não se ama. Ninguém quer ninguém. Amar é out, é babaca, é careta. Embora persistam essas estranhas fronteiras entre paixão e loucura, entre paixão e suicídio. Não compreendo como querer o outro possa tornar-se mais forte do que querer a si próprio.” Para Caio não existia meios termos, os sentimentos eram descritos de uma forma tão intensa que o leitor tem a impressão de ter sua vida estar sendo descrita. “Tem que ter coragem de olhar no fundo dos olhos de alguém que a gente ama e dizer uma coisa terrível, mas que tem que ser dita. Tem que ter coragem de olhar no fundo dos olhos de alguém que a gente ama e ouvir uma coisa terrível, que tem que ser ouvida. A vida é incontornável. A gente perde, leva porrada, é passado pra trás, cai. Dói, ai, dói demais. Mas passa.” Algo intrigante em suas obras são as personagens. Sempre solitárias e tristes, não possuem estrutura familiar e social e possuem uma relação de “frieza” com o mundo.

Caio escrevia sobre o que vivia, não havia ilusão ou sonhos em suas obras. Era o conhecimento empírico transformado em versos e isso o aproximava do leitor com facilidade. Em Morangos Mofados, de 1982, isso fica nítido. Crescido na época da ditadura, o autor buscava inspiração em momentos importantes de sua vida e fazia uma releitura rápida, porém despercebida de seu modo de pensar. Com contos que exploram especialmente a posição do narrador ou a ausência dele, numa narrativa que é fragmentada, densa e complexa, o livro apresenta problemas sociais e explora-os, apresentando uma visão de valores, condutas e ideologias próprias dos períodos autoritários e de sociedades conservadoras.

A verdade é que não há como ler seus textos sem possuir um autocontrole emocional forte, simplesmente, porque não é raro a identificação do leitor nos versos do poeta. Essa cumplicidade entre leitor e autor era buscada frequentemente por Caio em todas as suas obras, na intenção talvez de compartilhar ou amenizar sua dor, suas saudades, suas cicatrizes.

Quanto aos seus exageros…ah, todos temos e sabemos que, como dizia Vinícius de Moraes, “um grande amor só é bem grande se for triste”…. então, está tudo bem, Caio!



Para todos aqueles que desejam pintar, esculpir, desenhar, escrever o seu próprio caminho para a felicidade.